Testemunho
No dia
15 de abril passado, os membros da Congregação fomos convocados
pela professora Vera Maria para uma reunião, que teve lugar logo
no dia seguinte, 16 de abril. Nessa reunião a senhora Diretora-Geral
apresentou-nos uma Proposta de Deliberação (Nº 2),
dispondo "sobre o processo eleitoral de consulta para escolha do
Diretor-Geral do Colégio Pedro II, para gestão 2012-2016".
Esclarecendo e justificando a convocação e o tema da reunião,
disse-nos a professora Vera que, preocupada com a sua sucessão,
há meses fazia gestões junto ao Ministério da Educação
para que fosse orientada sobre como proceder no que se refere ao processo
sucessório da Direção-Geral do Colégio Pedro
II. Havia urgência, dizia ela, de se ter uma decisão a respeito,
já que seu mandato terminaria no dia 20 de agosto de 2012 e estava
sendo avaliado na Câmara dos Deputados - passando já, inclusive,
pelas últimas comissões, estando, então, em vias
de ser enviado para o Senado Federal - o Projeto de Lei 2134, que equipararia
o Colégio Pedro II aos Institutos Federais de Educação,
Ciência e Tecnologia. Ora, esse projeto de lei transformaria profundamente
a estrutura do Colégio, definindo, inclusive, normas para escolha
dos dirigentes escolares e temia a professora Vera que a aprovação
no Congresso Nacional, com a consequente sanção presidencial,
ocorresse em meio ao processo de escolha do(a) próximo(a) Diretor(a)-Geral
- daí a necessidade de que o MEC desse uma orientação
clara a respeito de como a Direção do CP II deveria proceder.
Finalmente, na semana anterior àquela em que fomos convocados para
a reunião da Congregação, o Ministério da
Educação determinara que a eleição do novo
dirigente máximo do Colégio, dada a virtual proximidade
da equiparação do CP II aos Institutos Federais, deveria
ser feita seguindo as normas para escolha de Reitor nesses Institutos,
normas essas definidas no Decreto 6.986 (20/10/2009), que reza, no Parágrafo
Único do Artigo 3º, o seguinte: "Os processos de consulta
para escolha dos cargos de Reitor e de Diretor-Geral de campus serão
finalizados em até noventa dias, contados da data de seu início".
A senhora Diretora-Geral procurou chamar a atenção dos membros
da Congregação para o fato de que tal determinação
gerara urgência em deflagrar o processo eleitoral, pois, contando
regressivamente os noventa dias a partir de 20 de agosto, e descontados
o período de férias e os recessos, praticamente estávamos
entrando já no prazo necessário para que se procedesse à
escolha do novo Diretor-Geral, que deveria, inclusive, se possível,
ser reconhecido pelo Ministério da Educação, para
que pudesse tomar posse no dia 21 de agosto de 2012. Temia a professora
Vera Maria um vácuo administrativo a partir do dia 20/08, caso
não pudesse ser empossado o novo Diretor-Geral, posto que seus
atos como administradora do Colégio só até aí
teriam validade; mais que isso, temia ela a possibilidade de ser designado
pelo Ministério um interventor para conduzir a administração
escolar, caso não fosse feita com rapidez a escolha do seu sucessor.
Foi aprovada, então, com algumas modificações, a
Deliberação Nº 2, instaurando-se o processo de consulta.
No dia 27 de abril, com a presença (sem direito a voto, mas com
direito a voz aprovado pelo Conselho), de um representante do Sindscope,
de duas representantes da ADCP II, de representações dos
Grêmios e, por determinação da presidente da Congregação,
com portas abertas para que os estudantes presentes na antessala pudessem
também acompanhar os debates, em quatro horas de discussões
foi 1) lido por esta representação docente, com a anuência
da senhora Diretora-Geral, um documento redigido pelos Grêmios com
várias reivindicações, 2) aprovada por unanimidade,
depois de feitos alguns esclarecimentos sobre a identificação
de alguns candidatos, a Deliberação Nº 3 ("Homologa
os nomes dos candidatos à Comissão Eleitoral que coordenará
o processo de consulta para escolha do Diretor-Geral do Colégio
Pedro II para gestão 2012-2016 e dá outras providências"),
3) decidido por um pleito em dois turnos, 4) estabelecido que cada eleitor
poderia votar em até três candidatos (a deliberação
da DG, antes aprovada, determinava a votação em um único
candidato, estudante, técnico ou professor), e 5) aprovado, com
alterações, o Anexo II à referida Deliberação
Nº 3, o qual tratava do "Cronograma de consulta para os membros
da Comissão Eleitoral". A alteração nesse Anexo
II consistiu, basicamente, no adiamento dos prazos do calendário
eleitoral por uma semana, haja vista a coincidência, com a semana
de provas, do tempo de campanha dos candidatos à comissão
eleitoral. Essa última decisão contou, a princípio,
com certa resistência da senhora Diretora-Geral, posto que, segundo
informou-nos a professora Vera Maria, o PL 2134 já passara pela
última comissão da Câmara, tendo que ser, consequentemente,
avaliado por duas outras no Senado, antes de ser encaminhada à
sanção presidencial; portanto, segundo a professora Vera,
se não prezássemos pela celeridade no processo, a equiparação
com os IFETs poderia ocorrer em meio ao processo eleitoral, com consequências
danosas para o mesmo e, possivelmente, também para a administração
do Colégio. A professora defendeu enfaticamente que estivéssemos
atentos a isso; mas, por fim, votou também a favor do adiamento
dos prazos em uma semana.
Uma vez eleitos os membros da Comissão Eleitoral, reuniu-se novamente
a Congregação no dia 17 de maio, em torno da seguinte pauta:
1) Solicitação à Congregação de participação
dos pais/responsáveis na escolha do Diretor-Geral; 2) Homologação
dos nomes dos eleitos - estudantes, servidores técnicos e docentes
- para formação da Comissão. Após algum debate
a respeito, foi acatada pelo plenário, por votação,
a proposta da professora Glória, diretora da Unidade Humaitá
II, de retirada do primeiro ponto de pauta, deixando para a Comissão
Eleitoral a decisão a respeito da questão. Já a homologação
dos nomes dos eleitos foi aprovada sem problemas.
Finalmente, no dia 28 de maio reuniu-se ainda uma vez mais a Congregação
do Colégio Pedro II, para decidir a respeito das regras que regeriam
a eleição. Duas propostas foram apresentadas pela Comissão
Eleitoral: 1) Seguiríamos o que vem definido no Decreto 6.986,
acima citado, ou 2) As regras seriam aquelas que vigoraram na eleição
de 2008. Antes da discussão a respeito e da consequente tomada
de decisão, alguns informes foram dados pela senhora Diretora-Geral:
dentre esses, que a ministra Míriam Belchior decretara ponto facultativo
nos dias 20, 21 e 22 de junho (o que encurtaria ainda mais o tempo disponível
para a eleição), e que o PL 2134 já tinha sido enviado
ao Senado, onde passou a ser avaliado como Projeto de Lei da Câmara
Nº 36. Relembrou, então, a professora, do risco de haver a
sanção presidencial ainda antes de se ver terminado o processo
eleitoral, de modo que lhe parecia mais conveniente dá-lo por encerrado
antes das férias de julho. A partir daí, propôs o
professor Oscar Halac (então diretor da Unidade Escolar Descentralizada
Duque de Caxias) que se mantivesse a obediência ao prazo de 90 dias,
tal como determinado no Decreto 6.986, posto, inclusive, que a greve,
naquele momento indicada pelo Sindicato Nacional dos Servidores Federais
(SINASEFE), poderia alongar ainda mais o processo eleitoral. O servidor
William do Nascimento, membro da Comissão Eleitoral e coordenador
do SINASEFE, respondeu que a greve estava, naquele momento, apenas indicada
pelo sindicato, disse que a comunidade do CP II é que viria a decidir
sobre entrar em greve ou não e defendeu a extensão do calendário
eleitoral até 29 de agosto, no que representava a posição
majoritária da Comissão Eleitoral. Outras pessoas fizeram
uso da palavra, entre elas a Diretora de Ensino, professora Ana Cristina,
que também se posicionou a favor de se respeitar os noventa dias
de prazo. Posto o tema em votação, a maioria dos membros
da Congregação manifestou-se a favor da extensão
do calendário eleitoral. Esta última reunião da Congregação
antes da greve (provavelmente a última desse fórum absolutamente)
começou por volta das 10:00 e prolongou-se além das 16:30.
Como é de conhecimento geral, no dia 18 de junho, por decisão
de assembleia dos servidores do Colégio Pedro II, foi iniciado
o movimento paredista, e no dia 25 do mesmo mês, contra a expectativa
majoritária, foi publicada no Diário Oficial da União
a Lei Nº 12.677 que, nas palavras da Procuradora-Chefe do CP II,
Maria Teresa Correia da Silva, "fez ingressar o Colégio Pedro
II na rede dos Institutos Federais, revogando toda a legislação
que criava e constituía a Instituição".
Opinião
Quando eu ainda estava
na graduação em Filosofia, em conversa informal com meu
primeiro professor de Lógica, falando da política departamental,
ouvi dele a seguinte pergunta: "- Mas será que o fulano não
percebe que isso não se faz, que é feio?..." Estranhei
a frase e, do alto dos meus vinte anos de idade, pensei: "- Só
o Paulo mesmo pra dizer uma coisa dessas! 'É feio...' E daí?!"
Para mim, à época, essa elocução parecia coisa
que a avó da gente diz, coisa de velho, que não faz muito
sentido. Mas, como, às vezes, juventude o tempo cura, muito depois
percebi o quanto de verdade há nessa relação entre
a beleza e a correção ética de uma ação.
Também não sabia ainda, naquele tempo, que a palavra com
que os gregos antigos expressavam o Bem é a mesma com que expressavam
o Belo ("És de opinião, Mênon, que quem deseja
as coisas belas deseja as boas?").
Coisas feias andam acontecendo no Colégio Pedro II - e injustas.
Quem, com boa memória, tiver presenciado as reuniões da
Congregação de que procuro acima fazer o relato, lembrará
a insistência com que a professora Vera Maria defendeu a necessidade
de se completar o processo eleitoral o mais rápido possível,
pois o Projeto de Lei poderia ser logo aprovado, etc., etc. Ríamos.
Confesso. Se eu não ria, pelo menos sorria do que me parecia uma
ingenuidade da professora, ignorância, talvez, dos ritos processuais
do Congresso: se uma modificação qualquer, por pequena que
fosse, tivesse sido feita em qualquer das Comissões do Senado,
o PL voltaria para a Câmara e todo o trâmite recomeçaria
do início! Ora, isso poderia significar - e, pensávamos,
significaria, com certeza! - que a equiparação do CP II
com os IFETs demoraria ainda meses para acontecer! Pois bem, a professora
Vera tinha razão no seu temor. Haverá CERTAMENTE quem veja
nisso a expressão de interesses ocultos, não declarados;
seguramente a professora sabia desde sempre que o Projeto de Lei seria
logo aprovado e, então, fomos todos manipulados de forma maquiavélica...
Eu, de minha parte, conforme disse a uma chefia de departamento que muito
respeito, prefiro evitar as teorias da conspiração e procuro
evitar atribuir superpoderes às pessoas. Não havia como
supor com razoabilidade sobre quando o PL seria sancionado pela presidente
Dilma! Por azar - ou sorte, não sei -, a sanção presidencial,
com a consequente equiparação, pegou-nos em meio ao processo
eleitoral, que, uma vez que lhe foi retirado o objetivo (eleger um Diretor-Geral),
perdeu todo o sentido. Não houvesse a interpretação
jurídica da coisa, expressa no parecer da Procuradora-Chefe do
CP II, o simples bom-senso já nos encaminharia nessa direção.
As regras que definimos (as mesmas de 2008) contrariam o Decreto que rege
as consultas nos Institutos Federais. Além disso, parece-me bem
razoável o receio de que o resultado de um processo que insistíssemos
em levar adiante nessas condições pudesse vir a ser questionado
na justiça.
E mais um detalhe: caso a eleição devesse transcorrer agora
partindo do ponto em que foi interrompida, não deveria a Congregação
do Colégio ser convocada eventualmente para endossar os atos da
Comissão Eleitoral ou os administrativos da Reitoria Pró-Tempore,
fosse quem fosse que estivesse no cargo? Mas, curiosamente, não
se ouve uma voz sequer levantando-se em defesa da convocação
do órgão deliberativo superior no Pedro II... Órgão
esse que, salvo engano meu, não está extinto, posto que
a lei é omissa a esse respeito. Enquanto não se aprova o
novo Estatuto, mantém-se o Colégio carente de um fórum
superior de deliberação, concentrando-se na Reitoria toda
a administração? Contudo, suponhamos que, de fato, seja
assim, pois é possível que a publicação da
lei 12.677 tenha extinguido a Congregação, dado que torna
sem efeito legislações anteriores cujos títulos vêm
ali relacionados.
Mas não será, então, que isso torna ainda mais flagrantemente
absurda a insistência em se manter o processo eleitoral que tinha
sido iniciado? Pois os atos da Comissão Eleitoral deveriam - alguns
deles, pelo menos - ser homologados pela Congregação que,
inclusive, constituiu essa mesma Comissão ao reconhecer e oficializar
o resultado da consulta que foi feita aos três segmentos da comunidade
escolar. Não havendo mais esse fórum deliberativo máximo
do Colégio, a quem a Comissão deveria reportar-se em caso
de dúvidas, homologação do resultado da eleição
ou outros atos? À professora Maria Helena, substituta da professora
Vera Maria, que seria uma das concorrentes na eleição?
O que o Ministério da Educação fez, ao empossar a
professora Vera Maria como Reitora Pró-Tempore, foi simplesmente
seguir a lei. A rigor, ela não estava afastada do cargo - só
o Ministro da Educação poderia proceder a esse afastamento.
A licença que tanto ela quanto o professor Oscar Halac tiraram,
visando a desincompatibilização com a candidatura ao cargo
de Diretor-Geral, não tem força legal. A professora Vera
não deixou de ser a Diretora-Geral por ter assim, de livre vontade,
se licenciado do cargo, e o que a lei 11.892 diz é que o Diretor-Geral
de uma instituição transformada em Instituto Federal "exercerá
esse cargo até o final de seu mandato em curso e em caráter
pro tempore, com a incumbência de promover, no prazo máximo
de 180 (cento e oitenta) dias, a elaboração e encaminhamento
ao Ministério da Educação da proposta de estatuto
e de plano de desenvolvimento institucional do Instituto Federal".
Sugerir ao MEC que a professora Maria Helena fosse nomeada em seu lugar?
Por que deveria fazê-lo? A professora Vera foi eleita e tem obrigações
com aqueles que a elegeram. Subtrair-se às suas obrigações
quando a situação mais exige sua presença na condução
dos assuntos do Colégio? Podemos até discordar do modo como
venha a proceder; mas, não se pode querer que haja de modo contrário
ao dever que lhe foi determinado pela eleição que a conduziu
ao cargo.
Quem pensa diferente, e acha que se deveria levar adiante um processo
eleitoral tão passível de questionamento, dá importância
maior ao que tem importância menor neste momento. Como muito bem
disseram numa assembleia da ADCP II, diretor (ou reitor) a gente elege
de quatro em quatro anos; estatuto de uma instituição como
o CP II, a gente formula, quem sabe, uma vez na vida!
Por tudo que descrevi acima, é completamente descabido falar de
"golpe" ou "intervenção" - além
de repulsivamente injusto. Poucas vezes na vida presenciei o falatório
(Ser e tempo, Parágrafo 35) expressar-se de forma tão exemplar.
Vera Maria, desta vez adiantando-se às nossas entidades, deu partida
ao processo eleitoral (diferentemente do que ocorreu há cinco anos,
quando a ADCP II, contrariando certo ceticismo, tomou a iniciativa de
solicitar ao MEC uma posição a respeito - e o resto é
história). E depois, em cada reunião da Congregação
que tratou dos trâmites para a escolha do seu sucessor (ou sucessora),
a professora Vera insistiu em advertir sobre o risco de se ver o Projeto
de Lei aprovado antes do término do processo eleitoral, de haver
uma vacância na direção se esse último não
estivesse resolvido completamente até o dia 20 de agosto de 2012
e da possibilidade de o MEC entregar a condução do Colégio
a alguém estranho ao nosso meio, ainda que temporariamente.
Contudo, parece-me que a professora, agora, exagera. Lamento ver a professora
Vera Maria desperdiçar a oportunidade de conduzir este momento
da vida do Colégio com o rigor que tal momento exige. Parece-me
que nossa Reitora faz uma indefensável concessão ao senso-comum
ao dar, também ela, mais importância à eleição
para o cargo de dirigente máximo do Colégio do que à
elaboração do Estatuto. Ensejar a redação
de um documento de tal gravidade em quinze horas, quando a lei lhe concede
seis meses para fazê-lo, por pressa de eleger o Conselho Superior
(que, então, recomeçará o processo eleitoral), isso
me parece nitidamente "colocar o carro na frente dos bois".
A lei (o Estatuto) tem mais importância do que o cargo que está
obrigado a observá-la. Está acima de nós como profissionais
desta instituição e deveria ser, mais do que uma (dentro
em pouco, mais uma) eleição eventual, a herança maior
a ser deixada àqueles para quem, em décadas, não
seremos mais do que lembranças.
Em 10 de setembro de
2012
*Flavio Costa Balod,
Professor de Filosofia, Diretor-Adjunto da UESCIII,
Representante docente da UESC III na Congregação, Conselheiro
da ADCPII
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