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Rio de Janeiro, 13 de setembro de 2012
 
ADCPII CONVIDA

 
O GOLPE INSTITUCIONAL E A DEMOCRACIA NO COLÉGIO PEDRO II
Por Licio Monteiro*

Nos últimos anos a América Latina viu renascer uma prática política que parecia relegada ao passado: o golpe de Estado. Mas os golpes recentemente aplicados em Honduras (2009) e no Paraguai (2012) colocaram em ação um novo modus operandi. Em vez de levar os fuzis à frente dos argumentos, caracterizando o golpe como militar, o que remeteria à lembrança dos passados autoritários desses países, os golpistas se colocaram no poder amparados pelas brechas da lei e inauguraram uma nova modalidade de golpe, o "golpe institucional".
Em ambos os casos, a reação da grande maioria dos governos latino-americanos, inclusive do governo brasileiro, bem como de organismos internacionais, como a UNASUL e a OEA, foi a condenação dos golpes, apontando uma série de ilegalidades promovidas pelos golpistas e defendendo algo que chamavam de "espírito da democracia".
Poderíamos utilizar essa situação para fazer uma analogia com o que tem ocorrido no Colégio Pedro II nos últimos 3 meses. De um lado, aqueles que foram colocados no poder, ou reconduzidos, amparados pelas mudanças súbitas na lei, pareceres jurídicos e, mais forte do que isso, a vontade explícita do MEC. De outro lado, uma comunidade que denuncia essa imposição como um golpe, um desrespeito à democracia interna do Colégio.
Retrocedamos um pouco no tempo para compreender melhor os fatos.
Em abril de 2012, foi iniciado um processo eleitoral para a escolha da nova Direção Geral do CPII. Uma comissão eleitoral foi eleita com representantes de professores, servidores técnico-administrativos e alunos, eleitos por seus pares. Houve inscrições de chapas e a campanha estava prestes a começar quando foi deflagrada a greve dos servidores do CPII em 18 de junho de 2012, acompanhando o movimento nacional dos servidores públicos federais que pararam em quase todos os setores.
Diante da greve no Colégio, a comissão eleitoral achou por bem adiar o pleito para o retorno das aulas. Porém, em 25 de junho, uma semana após a deflagração da greve, foi sancionada a Lei 12.677, que alterava a estrutura institucional do CPII, inserindo-o na Rede Federal de Educação Profissional, Científica e Tecnológica. As consequências dessa mudança são imediatas à vigência da nova lei e alteram a estrutura organizacional do Colégio. Uma das alterações é que a antiga figura da Direção Geral é substituída pela Reitoria. Detalhes podem ser lidos no parecer do MEC [ver link na página do CPII].
A situação jurídica em que o Colégio foi mergulhado com essa mudança é realmente complexa, não haveria qualquer saída isenta de controvérsias, ainda mais se acrescentarmos a essa complexidade jurídica todos os acontecimentos políticos que compõem o ambiente em que essa mudança ocorre.
Não vou adentrar os meandros do aspecto jurídico da questão, mas a matéria política. Todos os atores envolvidos nesse processo agem e tomam decisões a partir de considerações iminentemente políticas. Querer reduzir o processo a uma questão jurídica é só mais um artifício político - e dos mais perigosos, pois se protege na ideia de neutralidade.
O primeiro passo da aplicação da nova lei é a indicação de uma Reitora, que é a antiga Diretora Geral Vera Maria Ferreira Rodrigues. Segundo o Art. 14 da Lei 11.892/2008, que passa a reger a estrutura do CPII, ela se mantém nesse cargo "em caráter pro tempore, com a incumbência de promover, no prazo máximo de 180 dias, a elaboração e encaminhamento ao MEC da proposta de estatuto e de plano de desenvolvimento institucional do Instituto Federal, assegurada a participação da comunidade acadêmica na construção dos referidos instrumentos". Cabe destacar que na ocasião da entrada em vigência da lei, a Direção Geral era ocupada pela Professora Maria Helena S. Sampaio, uma vez que a antiga diretora estava afastada para concorrer à reeleição.
O que se observa é que o MEC institui uma Reitora pro tempore como marco inicial da nova estrutura organizacional do CPII. É uma Reitoria que se instala para criar um novo regulamento interno, baseado em alguns poucos parâmetros legais indicados pelo MEC.

Diante do vazio regulatório existente no CPII, visto que todo o ordenamento anterior está suspenso, todo ato da Reitora é soberano, não há regra para constituir comissão para elaborar proposta de estatuto e PDI. A única exigência é assegurar a participação da comunidade acadêmica.
O Parecer 856/2012 da Advocacia Geral da União, expedido em 16 de julho e publicado na página do Colégio Pedro II, tornou-se, pois, o salvo-conduto que confere legalidade à condução da Reitora Vera Maria, uma oportunidade de ser arbitrário em nome da lei. Que isso sirva para constituir o regulamento dos vários institutos federais recentemente criados já seria questionável. Mas utilizar o mesmo expediente para recriar uma instituição que já existe há 175 anos, desconsiderando particularmente o fato de que havia um processo eleitoral em curso, é incompreensível. Ainda mais: fazer isso em meio a um enfrentamento direto da comunidade com o MEC no período de greve coloca em evidência - ou pelo menos alimenta uma desconfiança - que foi algo induzido politicamente para beneficiar um lado da disputa.
A responsabilidade de conduzir a criação de um novo regulamento não se dá fora do contexto político no qual a própria Reitora é parte interessada. Não há constrangimento regulamentar para que a Reitora - que era Diretora Geral, virou candidata, virou Reitora e, possivelmente, será candidata de novo - possa conduzir essa transição de maneira vantajosa para seu projeto político pessoal. Não que isso necessariamente vá ocorrer - mas já está ocorrendo, visto a maneira como foi formada o GT para criar o estatuto. Essa situação sui generis exigiria uma transparência maior no processo.
E é isso que vem sendo caracterizado, politicamente, como golpe. Basicamente por três motivos.
Em primeiro lugar, a opção do MEC por reconduzir a antiga diretora Vera Maria, que já havia se afastado do cargo para concorrer à reeleição. E fazer isso durante a greve e no meio de uma eleição em curso.
Em segundo lugar, o significado atribuído aos termos "comunidade acadêmica" (Arts. 10 e 14, Lei 11.892/08) e "comunidade escolar" (Art. 12 da mesma lei). A comunidade acadêmica é especificada na lei como composta de professores, servidores técnico-administrativos e alunos, excluindo, portanto, os pais e responsáveis, que sempre foram considerados nas votações para a Direção Geral. Mas a mesma lei faz referência à "comunidade escolar" que participa do processo de consulta para "eleição" da Reitoria. Fica no ar a questão: "escolar" e "acadêmica" identificam a mesma comunidade? É uma confusão da lei? Qual dos dois termos seria mais apropriado para o caso do CPII? Haveria a possibilidade de considerar a especificidade do Colégio Pedro II para qualificar o que é essa comunidade?
Em terceiro lugar, a escolha da representação da "comunidade acadêmica" que forma o grupo de trabalho para elaboração do estatuto, exposta na Portaria nº 102, de 31 de agosto de 2012. São 16 membros, distribuídos entre representantes da Reitoria, das Diretorias-Gerais, dos Departamentos Pedagógicos, dos "servidores docentes", dos "servidores técnico-administrativos", dos Grêmios, do SINDSCOPE e da ADCPII, dois membros de cada, um titular e um suplente.
Detalhe: os representantes da Reitoria, das Diretorias-Gerais, dos Departamentos Pedagógicos, dos docentes e dos servidores técnico-administrativos, que compreendem 10 dos 16 membros do grupo de trabalho, são indicações pessoais da Reitora pro tempore, escolhidos independente de aceitação pelos próprios pares. Não precisa ser professor de matemática para saber o que isso significa.
O que a Reitora pro tempore conseguiu foi criar um dispositivo legal para legitimar uma ação arbitrária. Golpe, não só no sentido político, mas também como engenho, maquinação, um golpe de esperteza, que pressupõe a ausência da mesma na cabeça dos que aqui de fora acompanhamos todo o processo.
Não adianta a atual reitoria hastear no mastro do Colégio uma bandeira costurada com retalhos de leis, decretos e portarias como símbolo da legalidade e usar essa mesma bandeira para silenciar aqueles que legitimamente deveriam participar do processo de formação do novo regulamento que rege o Colégio Pedro II. Fazer isso e ainda esperar que não chamem de golpe é só mais um sintoma da distância que está se abrindo entre a Reitora e a comunidade.

Pode passar pelo teste da lei, mas está sendo reprovada no julgamento político e ético da comunidade do CPII.

* Licio Monteiro, ex-aluno e professor de Geografia da Unidade Humaitá II

 
ENSEJAR A REDAÇÃO DE UM DOCUMENTO DE TAL GRAVIDADE EM QUINZE HORAS PARECE NITIDAMENTE "COLOCAR O CARRO NA FRENTE DOS BOIS"
Por Flávio Balod*

Testemunho

No dia 15 de abril passado, os membros da Congregação fomos convocados pela professora Vera Maria para uma reunião, que teve lugar logo no dia seguinte, 16 de abril. Nessa reunião a senhora Diretora-Geral apresentou-nos uma Proposta de Deliberação (Nº 2), dispondo "sobre o processo eleitoral de consulta para escolha do Diretor-Geral do Colégio Pedro II, para gestão 2012-2016".
Esclarecendo e justificando a convocação e o tema da reunião, disse-nos a professora Vera que, preocupada com a sua sucessão, há meses fazia gestões junto ao Ministério da Educação para que fosse orientada sobre como proceder no que se refere ao processo sucessório da Direção-Geral do Colégio Pedro II. Havia urgência, dizia ela, de se ter uma decisão a respeito, já que seu mandato terminaria no dia 20 de agosto de 2012 e estava sendo avaliado na Câmara dos Deputados - passando já, inclusive, pelas últimas comissões, estando, então, em vias de ser enviado para o Senado Federal - o Projeto de Lei 2134, que equipararia o Colégio Pedro II aos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia. Ora, esse projeto de lei transformaria profundamente a estrutura do Colégio, definindo, inclusive, normas para escolha dos dirigentes escolares e temia a professora Vera que a aprovação no Congresso Nacional, com a consequente sanção presidencial, ocorresse em meio ao processo de escolha do(a) próximo(a) Diretor(a)-Geral - daí a necessidade de que o MEC desse uma orientação clara a respeito de como a Direção do CP II deveria proceder.
Finalmente, na semana anterior àquela em que fomos convocados para a reunião da Congregação, o Ministério da Educação determinara que a eleição do novo dirigente máximo do Colégio, dada a virtual proximidade da equiparação do CP II aos Institutos Federais, deveria ser feita seguindo as normas para escolha de Reitor nesses Institutos, normas essas definidas no Decreto 6.986 (20/10/2009), que reza, no Parágrafo Único do Artigo 3º, o seguinte: "Os processos de consulta para escolha dos cargos de Reitor e de Diretor-Geral de campus serão finalizados em até noventa dias, contados da data de seu início". A senhora Diretora-Geral procurou chamar a atenção dos membros da Congregação para o fato de que tal determinação gerara urgência em deflagrar o processo eleitoral, pois, contando regressivamente os noventa dias a partir de 20 de agosto, e descontados o período de férias e os recessos, praticamente estávamos entrando já no prazo necessário para que se procedesse à escolha do novo Diretor-Geral, que deveria, inclusive, se possível, ser reconhecido pelo Ministério da Educação, para que pudesse tomar posse no dia 21 de agosto de 2012. Temia a professora Vera Maria um vácuo administrativo a partir do dia 20/08, caso não pudesse ser empossado o novo Diretor-Geral, posto que seus atos como administradora do Colégio só até aí teriam validade; mais que isso, temia ela a possibilidade de ser designado pelo Ministério um interventor para conduzir a administração escolar, caso não fosse feita com rapidez a escolha do seu sucessor. Foi aprovada, então, com algumas modificações, a Deliberação Nº 2, instaurando-se o processo de consulta.
No dia 27 de abril, com a presença (sem direito a voto, mas com direito a voz aprovado pelo Conselho), de um representante do Sindscope, de duas representantes da ADCP II, de representações dos Grêmios e, por determinação da presidente da Congregação, com portas abertas para que os estudantes presentes na antessala pudessem também acompanhar os debates, em quatro horas de discussões foi 1) lido por esta representação docente, com a anuência da senhora Diretora-Geral, um documento redigido pelos Grêmios com várias reivindicações, 2) aprovada por unanimidade, depois de feitos alguns esclarecimentos sobre a identificação de alguns candidatos, a Deliberação Nº 3 ("Homologa os nomes dos candidatos à Comissão Eleitoral que coordenará o processo de consulta para escolha do Diretor-Geral do Colégio Pedro II para gestão 2012-2016 e dá outras providências"), 3) decidido por um pleito em dois turnos, 4) estabelecido que cada eleitor poderia votar em até três candidatos (a deliberação da DG, antes aprovada, determinava a votação em um único candidato, estudante, técnico ou professor), e 5) aprovado, com alterações, o Anexo II à referida Deliberação Nº 3, o qual tratava do "Cronograma de consulta para os membros da Comissão Eleitoral". A alteração nesse Anexo II consistiu, basicamente, no adiamento dos prazos do calendário eleitoral por uma semana, haja vista a coincidência, com a semana de provas, do tempo de campanha dos candidatos à comissão eleitoral. Essa última decisão contou, a princípio, com certa resistência da senhora Diretora-Geral, posto que, segundo informou-nos a professora Vera Maria, o PL 2134 já passara pela última comissão da Câmara, tendo que ser, consequentemente, avaliado por duas outras no Senado, antes de ser encaminhada à sanção presidencial; portanto, segundo a professora Vera, se não prezássemos pela celeridade no processo, a equiparação com os IFETs poderia ocorrer em meio ao processo eleitoral, com consequências danosas para o mesmo e, possivelmente, também para a administração do Colégio. A professora defendeu enfaticamente que estivéssemos atentos a isso; mas, por fim, votou também a favor do adiamento dos prazos em uma semana.
Uma vez eleitos os membros da Comissão Eleitoral, reuniu-se novamente a Congregação no dia 17 de maio, em torno da seguinte pauta: 1) Solicitação à Congregação de participação dos pais/responsáveis na escolha do Diretor-Geral; 2) Homologação dos nomes dos eleitos - estudantes, servidores técnicos e docentes - para formação da Comissão. Após algum debate a respeito, foi acatada pelo plenário, por votação, a proposta da professora Glória, diretora da Unidade Humaitá II, de retirada do primeiro ponto de pauta, deixando para a Comissão Eleitoral a decisão a respeito da questão. Já a homologação dos nomes dos eleitos foi aprovada sem problemas.
Finalmente, no dia 28 de maio reuniu-se ainda uma vez mais a Congregação do Colégio Pedro II, para decidir a respeito das regras que regeriam a eleição. Duas propostas foram apresentadas pela Comissão Eleitoral: 1) Seguiríamos o que vem definido no Decreto 6.986, acima citado, ou 2) As regras seriam aquelas que vigoraram na eleição de 2008. Antes da discussão a respeito e da consequente tomada de decisão, alguns informes foram dados pela senhora Diretora-Geral: dentre esses, que a ministra Míriam Belchior decretara ponto facultativo nos dias 20, 21 e 22 de junho (o que encurtaria ainda mais o tempo disponível para a eleição), e que o PL 2134 já tinha sido enviado ao Senado, onde passou a ser avaliado como Projeto de Lei da Câmara Nº 36. Relembrou, então, a professora, do risco de haver a sanção presidencial ainda antes de se ver terminado o processo eleitoral, de modo que lhe parecia mais conveniente dá-lo por encerrado antes das férias de julho. A partir daí, propôs o professor Oscar Halac (então diretor da Unidade Escolar Descentralizada Duque de Caxias) que se mantivesse a obediência ao prazo de 90 dias, tal como determinado no Decreto 6.986, posto, inclusive, que a greve, naquele momento indicada pelo Sindicato Nacional dos Servidores Federais (SINASEFE), poderia alongar ainda mais o processo eleitoral. O servidor William do Nascimento, membro da Comissão Eleitoral e coordenador do SINASEFE, respondeu que a greve estava, naquele momento, apenas indicada pelo sindicato, disse que a comunidade do CP II é que viria a decidir sobre entrar em greve ou não e defendeu a extensão do calendário eleitoral até 29 de agosto, no que representava a posição majoritária da Comissão Eleitoral. Outras pessoas fizeram uso da palavra, entre elas a Diretora de Ensino, professora Ana Cristina, que também se posicionou a favor de se respeitar os noventa dias de prazo. Posto o tema em votação, a maioria dos membros da Congregação manifestou-se a favor da extensão do calendário eleitoral. Esta última reunião da Congregação antes da greve (provavelmente a última desse fórum absolutamente) começou por volta das 10:00 e prolongou-se além das 16:30.
Como é de conhecimento geral, no dia 18 de junho, por decisão de assembleia dos servidores do Colégio Pedro II, foi iniciado o movimento paredista, e no dia 25 do mesmo mês, contra a expectativa majoritária, foi publicada no Diário Oficial da União a Lei Nº 12.677 que, nas palavras da Procuradora-Chefe do CP II, Maria Teresa Correia da Silva, "fez ingressar o Colégio Pedro II na rede dos Institutos Federais, revogando toda a legislação que criava e constituía a Instituição".

Opinião

Quando eu ainda estava na graduação em Filosofia, em conversa informal com meu primeiro professor de Lógica, falando da política departamental, ouvi dele a seguinte pergunta: "- Mas será que o fulano não percebe que isso não se faz, que é feio?..." Estranhei a frase e, do alto dos meus vinte anos de idade, pensei: "- Só o Paulo mesmo pra dizer uma coisa dessas! 'É feio...' E daí?!" Para mim, à época, essa elocução parecia coisa que a avó da gente diz, coisa de velho, que não faz muito sentido. Mas, como, às vezes, juventude o tempo cura, muito depois percebi o quanto de verdade há nessa relação entre a beleza e a correção ética de uma ação. Também não sabia ainda, naquele tempo, que a palavra com que os gregos antigos expressavam o Bem é a mesma com que expressavam o Belo ("És de opinião, Mênon, que quem deseja as coisas belas deseja as boas?").
Coisas feias andam acontecendo no Colégio Pedro II - e injustas. Quem, com boa memória, tiver presenciado as reuniões da Congregação de que procuro acima fazer o relato, lembrará a insistência com que a professora Vera Maria defendeu a necessidade de se completar o processo eleitoral o mais rápido possível, pois o Projeto de Lei poderia ser logo aprovado, etc., etc. Ríamos. Confesso. Se eu não ria, pelo menos sorria do que me parecia uma ingenuidade da professora, ignorância, talvez, dos ritos processuais do Congresso: se uma modificação qualquer, por pequena que fosse, tivesse sido feita em qualquer das Comissões do Senado, o PL voltaria para a Câmara e todo o trâmite recomeçaria do início! Ora, isso poderia significar - e, pensávamos, significaria, com certeza! - que a equiparação do CP II com os IFETs demoraria ainda meses para acontecer! Pois bem, a professora Vera tinha razão no seu temor. Haverá CERTAMENTE quem veja nisso a expressão de interesses ocultos, não declarados; seguramente a professora sabia desde sempre que o Projeto de Lei seria logo aprovado e, então, fomos todos manipulados de forma maquiavélica... Eu, de minha parte, conforme disse a uma chefia de departamento que muito respeito, prefiro evitar as teorias da conspiração e procuro evitar atribuir superpoderes às pessoas. Não havia como supor com razoabilidade sobre quando o PL seria sancionado pela presidente Dilma! Por azar - ou sorte, não sei -, a sanção presidencial, com a consequente equiparação, pegou-nos em meio ao processo eleitoral, que, uma vez que lhe foi retirado o objetivo (eleger um Diretor-Geral), perdeu todo o sentido. Não houvesse a interpretação jurídica da coisa, expressa no parecer da Procuradora-Chefe do CP II, o simples bom-senso já nos encaminharia nessa direção. As regras que definimos (as mesmas de 2008) contrariam o Decreto que rege as consultas nos Institutos Federais. Além disso, parece-me bem razoável o receio de que o resultado de um processo que insistíssemos em levar adiante nessas condições pudesse vir a ser questionado na justiça.
E mais um detalhe: caso a eleição devesse transcorrer agora partindo do ponto em que foi interrompida, não deveria a Congregação do Colégio ser convocada eventualmente para endossar os atos da Comissão Eleitoral ou os administrativos da Reitoria Pró-Tempore, fosse quem fosse que estivesse no cargo? Mas, curiosamente, não se ouve uma voz sequer levantando-se em defesa da convocação do órgão deliberativo superior no Pedro II... Órgão esse que, salvo engano meu, não está extinto, posto que a lei é omissa a esse respeito. Enquanto não se aprova o novo Estatuto, mantém-se o Colégio carente de um fórum superior de deliberação, concentrando-se na Reitoria toda a administração? Contudo, suponhamos que, de fato, seja assim, pois é possível que a publicação da lei 12.677 tenha extinguido a Congregação, dado que torna sem efeito legislações anteriores cujos títulos vêm ali relacionados.
Mas não será, então, que isso torna ainda mais flagrantemente absurda a insistência em se manter o processo eleitoral que tinha sido iniciado? Pois os atos da Comissão Eleitoral deveriam - alguns deles, pelo menos - ser homologados pela Congregação que, inclusive, constituiu essa mesma Comissão ao reconhecer e oficializar o resultado da consulta que foi feita aos três segmentos da comunidade escolar. Não havendo mais esse fórum deliberativo máximo do Colégio, a quem a Comissão deveria reportar-se em caso de dúvidas, homologação do resultado da eleição ou outros atos? À professora Maria Helena, substituta da professora Vera Maria, que seria uma das concorrentes na eleição?
O que o Ministério da Educação fez, ao empossar a professora Vera Maria como Reitora Pró-Tempore, foi simplesmente seguir a lei. A rigor, ela não estava afastada do cargo - só o Ministro da Educação poderia proceder a esse afastamento. A licença que tanto ela quanto o professor Oscar Halac tiraram, visando a desincompatibilização com a candidatura ao cargo de Diretor-Geral, não tem força legal. A professora Vera não deixou de ser a Diretora-Geral por ter assim, de livre vontade, se licenciado do cargo, e o que a lei 11.892 diz é que o Diretor-Geral de uma instituição transformada em Instituto Federal "exercerá esse cargo até o final de seu mandato em curso e em caráter pro tempore, com a incumbência de promover, no prazo máximo de 180 (cento e oitenta) dias, a elaboração e encaminhamento ao Ministério da Educação da proposta de estatuto e de plano de desenvolvimento institucional do Instituto Federal". Sugerir ao MEC que a professora Maria Helena fosse nomeada em seu lugar? Por que deveria fazê-lo? A professora Vera foi eleita e tem obrigações com aqueles que a elegeram. Subtrair-se às suas obrigações quando a situação mais exige sua presença na condução dos assuntos do Colégio? Podemos até discordar do modo como venha a proceder; mas, não se pode querer que haja de modo contrário ao dever que lhe foi determinado pela eleição que a conduziu ao cargo.
Quem pensa diferente, e acha que se deveria levar adiante um processo eleitoral tão passível de questionamento, dá importância maior ao que tem importância menor neste momento. Como muito bem disseram numa assembleia da ADCP II, diretor (ou reitor) a gente elege de quatro em quatro anos; estatuto de uma instituição como o CP II, a gente formula, quem sabe, uma vez na vida!
Por tudo que descrevi acima, é completamente descabido falar de "golpe" ou "intervenção" - além de repulsivamente injusto. Poucas vezes na vida presenciei o falatório (Ser e tempo, Parágrafo 35) expressar-se de forma tão exemplar. Vera Maria, desta vez adiantando-se às nossas entidades, deu partida ao processo eleitoral (diferentemente do que ocorreu há cinco anos, quando a ADCP II, contrariando certo ceticismo, tomou a iniciativa de solicitar ao MEC uma posição a respeito - e o resto é história). E depois, em cada reunião da Congregação que tratou dos trâmites para a escolha do seu sucessor (ou sucessora), a professora Vera insistiu em advertir sobre o risco de se ver o Projeto de Lei aprovado antes do término do processo eleitoral, de haver uma vacância na direção se esse último não estivesse resolvido completamente até o dia 20 de agosto de 2012 e da possibilidade de o MEC entregar a condução do Colégio a alguém estranho ao nosso meio, ainda que temporariamente.
Contudo, parece-me que a professora, agora, exagera. Lamento ver a professora Vera Maria desperdiçar a oportunidade de conduzir este momento da vida do Colégio com o rigor que tal momento exige. Parece-me que nossa Reitora faz uma indefensável concessão ao senso-comum ao dar, também ela, mais importância à eleição para o cargo de dirigente máximo do Colégio do que à elaboração do Estatuto. Ensejar a redação de um documento de tal gravidade em quinze horas, quando a lei lhe concede seis meses para fazê-lo, por pressa de eleger o Conselho Superior (que, então, recomeçará o processo eleitoral), isso me parece nitidamente "colocar o carro na frente dos bois". A lei (o Estatuto) tem mais importância do que o cargo que está obrigado a observá-la. Está acima de nós como profissionais desta instituição e deveria ser, mais do que uma (dentro em pouco, mais uma) eleição eventual, a herança maior a ser deixada àqueles para quem, em décadas, não seremos mais do que lembranças.

Em 10 de setembro de 2012

*Flavio Costa Balod, Professor de Filosofia, Diretor-Adjunto da UESCIII,
Representante docente da UESC III na Congregação, Conselheiro da ADCPII

 

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